Thinkers

blog de uma rapariga sem estilo

9.1.10

Sailboat

meu Amor,



se ambos fôssemos um barco à vela, rumaríamos em direcção ao Norte, procurando o firmamento da Estrela. entenderíamos, Amor, que navegando em águas paradas ou tumultosas, geladas ou amenas, os nossos remos seriam sempre meras testemunhas da Sua presença.
um dia, fartarmo-nos-emos, certamente, de remar, e rumar ao Norte não fará parte dos nossos planos. nesse dia, deixamos de ser um barco à vela: seremos tábuas e remos separados e chegaremos ao Sul, onde o brilho da Estrela e a sua luz não nos serão oferecidos de presente todos os dias.
eventualmente, daremos à costa. as tábuas de que somos feitos estarão partidas em mil bocados, separadas pela força das águas. perdidas. adormeceremos para não sentirmos dor e esperaremos que, milagrosamente, o Tempo repare as madeiras, que já estarão secas, pois já purgaram a água que as fazia inchar. e, um dia, seremos jangada, até que outra encontremos e voltemos a ser um veleiro.

(meu Amor, meu Amor, meu Amor,

quantas vezes não te disse eu "amo-te", sem, no entanto, verbalizar? - se não verbalizava, como poderias, Tu, ouvir?
quantas vezes parafraseei apenas para disfarçar o medo que sentia de Te amar?)


se, quando for jangada, me lembrar dos nossos trilhos rasgados no mar, em direcção ao Norte, será porque estou incompleta. será porque não deixei de ser barco à vela contigo, embora tenhas deixado de o ser comigo. será porque as duas metades da laranja de que é feita a Terra, não serão vistas por nós de igual forma, e para mim o Equador estará tão mais longe do que para Ti.

engolirei mais água, incharei cada madeira da minha jangada e esperarei que o seu último poro deixe de borbulhar, e afundarei. e afundar-te-ei comigo. renascerei.

meu Amor, não querendo maçar-te, deixa-me apenas dizer-te:

lembro-me de cada trilho rasgado no mar e de cada fenda aberta no nosso barco à vela, sorrindo em busca da Estrela. lembro-me de cada aventura. lembro-me da água salgada a envolver-nos como a um todo. lembro-me de Ti e de mim e de não saber que éramos dois. e lembro-me de não saber que éramos um, até descobrir que estava sozinha.

ainda assim,

teremos sempre a Estrela do Norte.


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